"A síndrome do coração de atleta
consiste em uma constelação de alterações estruturais e funcionais, as
quais ocorrem no coração de indivíduos que treinam por mais de 1 h na
maioria dos dias"
A síndrome é assintomática e os sinais incluem
bradicardia, sopro sistólico e sons extracardíacos. Anormalidades
eletrocardiográficas são comuns. O diagnóstico é clínico ou por
ecocardiografia. Não há necessidade de tratamento. A síndrome é
significativa, pois deve ser distinguida de doenças cardíacas graves.
Os treinamentos de resistência e persistência intensivos e
prolongados acarretam muitas adaptações fisiológicas. As sobrecargas de
volume e pressão VE aumentam, o que, ao longo do tempo, aumenta a massa
muscular VE, a espessura da parede e as dimensões da câmara. Aumentam o
volume de ejeção e o DC máximo, contribuindo para FC de repouso mais
baixa e tempo de enchimento diastólico mais longo. A FC mais baixa
decorre principalmente do aumento do tônus vagal, mas a diminuição da
ativação simpática e outros fatores não autônomos que diminuem a
atividade intrínseca do nó sinusal podem ter algum papel. A bradicardia
diminui a demanda miocárdica de O2 e, ao mesmo tempo, aumentos da Hb total e do volume sanguíneo exacerbam o transporte de O2.
Apesar dessas alterações, as funções sistólica e diastólica permanecem
normais. As alterações estruturais em mulheres são classicamente menos
intensas do que em homens da mesma idade, dimensões corporais e
treinamento.
Sinais e sintomas
Não existem sintomas. Os sinais variam, mas podem envolver:
bradicardia; impulso VE deslocado lateralmente, com maior extensão e
amplitude; sopro sistólico de ejeção (fluxo) na borda esternal esquerda
inferior; B3 decorrente do enchimento ventricular diastólico rápido e inicial; B4,
mais bem auscultada durante bradicardia em repouso, pois o tempo de
enchimento diastólico está aumentado, e pulsos carotídeos
hiperdinâmicos. Tais sinais refletem alterações cardíacas estruturais
adaptativas ao esforço intenso.
Diagnóstico
-
Avaliação clínica
-
Normalmente eletrocardiograma
-
Ocasionalmente ecocardiograma
-
Raramente teste de esforço
Os achados são detectados tipicamente durante a triagem de rotina
ou avaliação de sintomas não relacionados. A maioria dos atletas não
requer investigação extensiva, embora geralmente o ECG seja indicado. Se
os sintomas sugerirem uma doença cardíaca (p. ex., palpitação, dor
torácica), realizam-se ECG, ecocardiograma e teste de esforço.
A síndrome do coração de atleta é um diagnóstico de exclusão,
devendo ser distinguida de doenças que provocam achados similares, mas
potencialmente fatais (p. ex., cardiomiopatia dilatada ou hipertrófica,
cardiopatia isquêmica e displasia arritmogênica VD).
ECG
Várias mudanças de ritmo e traçado do ECG podem ocorrer; elas
pouco se correlacionam à intensidade do treinamento e ao desempenho
cardiovascular. O achado eletrocardiográfico mais comum é
-
a bradicardia sinusal.
É raro que a FC seja inferior a 40 bpm. Em geral, a arritmia
sinusal acompanha a FC baixa. A bradicardia de repouso também pode
predispor a
-
Ectopia atrial ou ventricular (incluindo acopladas e períodos de TV não sustentada); as pausas após os batimentos ectópicos não excedem 4 s
-
Marca-passo atrial migratório
-
Fibrilação atrial
Outros achados eletrocardiográficos passíveis de ocorrer são:
-
BAV do primeiro grau (em até um terço dos atletas)
-
BAV do segundo grau (principalmente do tipo 1), que ocorre durante repouso e desaparece com o esforço
-
Complexos QRS de alta voltagem, com alterações da onda T na região inferolateral (refletindo HVE)
-
Inversões profundas de onda T nas derivações anterolaterais
-
BRD incompleto
No entanto, o BAV de terceiro grau é anormal e deve ser extensamente investigado.
Essas alterações eletrocardiográficas e de ritmo cardíaco não
estão associadas a eventos clínicos adversos, sugerindo que várias
arritmias não são anormais em atletas. As arritmias são normalmente
eliminadas ou substancialmente reduzidas após um breve período de
descondicionamento.
Ecocardiografia
A ecocardiografia pode distinguir entre síndrome do coração de atleta e cardiomiopatias (Fatores que distinguem a síndromedo coração de atleta da cardiomiopatia),
mas como existe um continuum do aumento cardíaco fisiológico até o
patológico, a distinção nem sempre é clara. A zona de sobreposição entre
coração de atleta e cardiomiopatia é a espessura do septo VE entre 13 e
15 mm nos homens e de 11 a 13 mm nas mulheres. Nesta área de
sobreposição, a presença de movimento sistólico anterior da valva mitral
sugere fortemente cardiomiopatia hipertrófica. Em geral, as alterações
ecocardiográficas têm baixa correlação com o nível de treinamento e o
desempenho cardiovascular. É comum detectar sinais de insuficiências
mitral e tricúspide.
Teste de esforço
Durante o teste de esforço, a FC permanece mais baixa que o
normal no estresse submáximo e aumenta de maneira apropriada e
comparável em não atletas no estresse máximo, recuperando-se rapidamente
após o esforço. A resposta da PA é normal: a PA sistólica aumenta, a PA
diastólica diminui e a PA média permanece relativamente constante.
Muitas alterações no ECG de repouso diminuem ou desaparecem durante o
esforço. Esse aspecto é característico da síndrome do coração de atleta,
distinguindo-a das condições patológicas. Entretanto, a
pseudonormalização das inversões da onda T pode refletir isquemia
miocárdica e, por isso, exige investigação adicional em atletas idosos.
Fatores que distinguem a síndrome do coração de atleta da cardiomiopatia
Aspecto
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Coração de atleta
|
Cardiomiopatia
|
Espessura septal do ventrículo esquerdo*
|
Em homens, <13 mm
Em mulheres <11 mm
|
Em homens, >15 mm
Em mulheres >13 mm
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Diâmetro diastólico VE final†
|
<60 mm
|
>70 mm
|
Função diastólica
|
Normal (relação E:A >1)
|
Anormal (relação E:A <1)
|
Hipertrofia septal
|
Simétrica
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Assimétrica (na cardiomiopatia hipertrófica)
|
História familiar
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Nenhuma
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Pode estar presente
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Resposta pressórica ao exercício
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Normal
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Normal ou resposta sistólica reduzida
|
Descondicionamento
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Regressão da HVE
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Sem regressão da HVE |
*Os valores entre 13 e 15 mm para homens e 11 a 13 para mulheres são indeterminados. |
||
†Um valor entre 60 e 70 mm é indeterminado. |
||
A relação E:A equivale à razão entre as velocidades de fluxo transmitral precoce e tardia. |
Prognóstico
Embora as alterações estruturais macroscópicas assemelhem-se às
de algumas doenças cardíacas, não existem efeitos adversos aparentes. Na
maioria dos casos, as alterações estruturais e a bradicardia regridem
com a interrupção do treinamento, embora em cerca de 20% dos atletas de
elite ocorra aumento residual da câmara, levantando questões, na
ausência de dados a longo prazo, sobre a síndrome do coração de atleta
ser realmente benigna.
Tratamento
Não há necessidade de tratamento, embora possam ser necessários
3 meses de perda de condicionamento para monitorar a regressão do VE,
como uma maneira de distinguir essa síndrome da cardiomiopatia. Essa
perda de condicionamento pode interferir amplamente na vida do atleta e
ser recebida com resistência. Fonte: msdmanuals.com/pt-br
Assista agora este vídeo didático para melhor compreensão da doença:
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