"A ansiedade é um
transtorno que se destaca na atualidade como consequência do mundo
agitado, cheio de tensões"
Este transtorno vem afetando a população de
um modo geral, independente da idade. Avaliando o cenário global de
transtornos psicológicos, dados internacionais mostram que as taxas de
prevalência de transtornos de ansiedade na infância e adolescência
variam entre 6% a 20%. Segundo um estudo de Fleitlich-Bilyk estima-se no
Brasil que os índices de prevalência de ansiedade em crianças e
adolescentes é de 4,6% em crianças.
A
estimativa de que crianças e adolescentes em algum momento de sua vida
preencham os critérios de diagnósticos para pelo menos um dos Transtorno
de Ansiedade é de aproximadamente 10%. Os quadros mais frequentes de
ansiedade são: O Transtorno de Ansiedade Generalizada e Transtorno de
Ansiedade à Separação.
Em
crianças, principalmente nas menores verifica-se que diferentemente dos
adultos, estas não conseguem reconhecer os seus medos como exagerados,
ou irracionais. O seu desenvolvimento emocional implica sobre as causas e
a maneira como os medos e preocupações tanto normais como patológicas
irão se manifestar.
Exemplo: Numa manhã como tantas outras o seu filho vira-se para você e diz: “Eu não quero ir para a escola. O meu estômago dói. Por favor, não me faça ir.” Você começa a ficar frustrado e pensa: “Aqui vamos nós de novo.” O que deveria ser uma simples rotina da manhã explode num desafio assustador. Você olha para o seu filho e vê o terror genuíno. Você quer consolá-lo. Você quer aliviar a preocupação excessiva que se tornou parte integrante da sua vida quotidiana. Em primeiro lugar, tenta a lógica. “Vamos, eu coloco a música que tu gostas.” Ele não se moveu. Você tenta tranquilizá-lo.”Eu prometo que vais ficar bem. Olhe para mim … confias em mim, certo?” A criança acena com a cabeça. Poucos segundos depois, ele sussurra: “Por favor, não me faça ir.” Você fica irritado: “Vais entrar no carro agora, ou haverá consequências graves. Ficas sem iPad durante uma semana!” Ele olha para você como se o obrigasse a ir para o inferno. Ele entra no carro, derrotado. Você sente-se terrível.
Se isto soa familiar,
sei que você não está sozinho. Dói ver o seu filho a ser vítima da
preocupação e angustia sobre situações que, francamente, não parecem
assustadoras. Mas, na verdade, para a mente da criança, essas situações
são verdadeiramente ameaçadoras. Essas ameaças percebidas podem criar
uma resposta real no sistema nervoso. Chamamos a essa resposta – ansiedade.
Muitas
crianças faltam à escola, atividades sociais, e perdem uma boa noite de
descanso apenas porque têm pensamentos de preocupação na sua
cabeça. Muitos pais sofrem de frustração e um sentimento de impotência
quando testemunham o seu filho neste estado a maior parte dos dias.
Não
existe uma solução pronta para a ansiedade que sirva para todas as
crianças, há sim uma infinidade de técnicas eficazes baseadas em
pesquisas que podem ajudar a controlá-la, muitas das quais são simples
de aprender. É possível os pais aprenderem. É possível ensinar às
crianças estas habilidades de enfrentamento. É possível ensinar as
crianças a encontrarem um significado, propósito e felicidade nas suas
vidas. Para ajudar neste caminho, apresento 7 formas de aliviar a
ansiedade que os pais de crianças ansiosas podem aplicar de imediato:
1 – Pare de tranquilizar o seu filho
Você
sabe que não há motivos para a criança preocupar-se, então diz, “Confia
em mim. Não há nada para te preocupares.” Todos nós desejamos que fosse
tão simples assim. Porque é que a sua tentativa de tranquilidade cai em
saco roto? Na verdade, não é porque a criança não está ouvindo. A
criança ansiosa quer desesperadamente ouvi-lo, mas o cérebro não deixa
isso acontecer. Durante os períodos de ansiedade, há uma rápida descarga
de produtos químicos e processos mentais que são ativados com um
objetivo prioritário para o corpo – a sobrevivência. O que contribui
para este fenômeno é que o córtex pré-frontal (a parte mais lógica do
cérebro) é colocada em espera, enquanto o cérebro emocional mais
automatizado assume as funções de resposta perante a situação
estressante.
Por outras palavras, é realmente difícil para o seu filho
pensar com clareza, usar a lógica ou mesmo lembrar-se de como executar
as tarefas básicas. O que você deve fazer em vez de tentar racionalizar e querer que a preocupação do seu filho desapareça? Aplique os quatro passos seguintes:
- Pare – Pare por breves momentos e faça algumas respirações profundas com a criança. A respiração profunda pode ajudar a inverter a resposta do sistema nervoso.
- Enfatize – A ansiedade é assustadora. A criança quer saber que você percebe isso.
- Avalie – Assim que a criança fique mais calma, é hora de descobrir possíveis soluções.
- Desapegue-se – Deixe
de lado a sua culpa; você é um pai ou educador incrível para a criança,
fornecendo as ferramentas para gerir a sua preocupação.
2 – Destaque o lado positivo da preocupação
A
ansiedade já é suficientemente perturbadora para a criança, por isso,
não podemos passar a mensagem que estar preocupada significa que algo de
errado existe com ela. Muitas crianças ainda desenvolvem mais ansiedade
por estarem ansiosas ou preocupadas. Ensine à criança que a
preocupação, de fato, tem um propósito.
Quando
os nossos ancestrais iam caçar e colher alimentos havia perigo no
ambiente, e estar preocupado ajudou a evitar ataques dos animais
ferozes, como por exemplo o tigres com dentes de sabre. Nos tempos
modernos, nós não temos uma necessidade de fugir dos predadores, mas
continuamos com esse mecanismo de resposta ansiosa que nos protege – a preocupação.
A
preocupação é um mecanismo de proteção. A preocupação soa um alarme em
nosso sistema e ajuda-nos a sobreviver perante a percepção de perigo.
Ensine à criança que a preocupação é perfeitamente normal, e que pode
ajudar a proteger-nos, e que todas as pessoas de vez em quando
experimentam isso. Às vezes o nosso sistema corporal dispara alarmes
falsos, mas este tipo de preocupação (ansiedade) pode ser colocado à
prova com algumas técnicas simples.
3 – Enquadre a ansiedade da criança com os acontecimentos de vida
Como
você provavelmente sabe, ignorar a ansiedade não ajuda. Mas enquadrar a
ansiedade com os acontecimentos de vida e falar com a criança sobre a
relação que existe entre o incômodo sentido e a sua percepção dos
acontecimentos, é um fator preponderante para restabelecer o equilíbrio emocional.
Criar um personagem para explicar esta relação pode tornar mais fácil o entendimento da criança. Por
exemplo, você pode criar um personagem que personifica a ansiedade.
Vamos chamar-lhe Oscar. O Oscar vive no velho cérebro que é responsável
por proteger-nos quando estamos em perigo. Claro que às vezes o Oscar
fica um pouco fora de controle e quando isso acontece, temos de falar
calmamente para ele. Você pode usar esta mesma ideia com um boneco de
pelúcia ou mesmo teatralizar o personagem em casa.
Personificando
a preocupação ou criando um personagem tem vários benefícios. Isso pode
ajudar a desmistificar as sensações incômodas sentidas no corpo das
criança quando ela fica ansiosa ou preocupada em excesso. Este
procedimento pode ajudar a que a criança reative a parte do
processamentos lógico da informação, e funcionar como uma ferramenta
que pode usar por conta própria a qualquer momento.
4 – Ensine a criança a ser um detetive de pensamentos
A preocupação
é a maneira que o cérebro desenvolveu para proteger-nos do perigo. Para
se certificar de que estamos realmente prestando atenção, a mente
muitas vezes exagera o objeto da preocupação (por exemplo, confundindo
um pedaço de pau com uma cobra). Você pode ter aprendido que ensinar as
crianças a pensar mais positivamente poderia acalmar as suas
preocupações. Isto é verdade, mas isoladamente não chega. O melhor
remédio para o pensamento distorcido não é o pensamento positivo, mas
sim o pensamento preciso. Ajude a criança a aplicar os 3 passos seguintes:
- Pegar os pensamentos: Imagine que cada pensamento que você tem flutua acima da sua cabeça numa bolha (como o que você vê em quadrinhos). Agora, pegue um dos pensamentos de preocupação, como: “Ninguém na escola gosta de mim.”
- Recolher evidências: Em seguida, colete evidências para apoiar ou negar este pensamento. Ensine a criança a não fazer julgamentos sobre as preocupações com base apenas em sentimentos. Os sentimentos não são fatos. (Evidências de suporte da preocupação: “Eu tive dificuldade em encontrar alguém que quisesse sentar-se comigo no almoço.” Negar a evidência da preocupação: “O Antônio e eu fazemos os trabalhos de casa juntos, ele é meu amigo.“
- Desafiar os pensamentos: A melhor maneira (e mais divertida) de fazer isso é ensinar a criança a ter um debate consigo mesma.
5 – Permita que a criança se preocupe
Como
expliquei anteriormente, dizer à criança para não se preocupar não vai
impedi-la de fazê-lo. Se as crianças conseguissem simplesmente deixar de
se sentirem mal, elas fariam-no. O que melhor funciona é passar a
mensagem que não existem nenhum mal em preocuparmo-nos, e que em doses
adequadas, pode ser útil.
Crie
um ritual diário reservado exclusivamente para abordar os temas acerca
dos quais a criança se preocupa ou conduzem à ansiedade. Pode ser um
período de 10 a 15 minutos, durante o qual incentiva a criança a
sentir-se livre para falar ou escrever sobre as suas preocupações. Você
pode tornar a atividade divertida. Por exemplo, decorar uma caixa da
preocupação. Durante o tempo de preocupação, não há regras sobre o que
constitui uma preocupação válida, vale tudo. Quando o tempo chegar ao
fim, a caixa deve ser fechada e dizer adeus às preocupações para esse
dia.
6 – Ajude a criança a mudar o discurso de: “E se…” para, “O que posso fazer para…”
Vou
revelar-lhe o seguinte, nós seres humanos somos capazes de viajar no
tempo. Não fisicamente, mas mentalmente. De fato, mentalmente gastamos
muito tempo com a cabeça no futuro. Para uma criança que sofre de ansiedade, este tipo de viagem mental no tempo pode exacerbar a preocupação, levando-a a fazer perguntas do género: “E se eu não conseguir abrir o meu armário e perder a aula?” ou “E se a Inês não falar comigo hoje?” ou “E se eu não passar no teste?“A pesquisa mostra que voltar para o momento presente pode ajudar a aliviar essa tendência.
Um método eficaz de fazer isso é praticar exercícios de conscientização. A Atenção Plena (Mindfullness)
traz uma criança do discurso “e se…” para, “o que posso fazer para”.
Para praticar isso, ajude o seu filho a concentrar-se na respiração por
alguns minutos. Deixo um pequeno exemplo:
Medida de ação: Quando
a criança começa a sentir-se ansiosa, explique-lhe que deverá usar essa
sensação como uma sugestão para fazer pelo menos uma respiração
abdominal profunda. Essa respiração vai iniciar a resposta de
relaxamento. Para praticar, ajude a criança a fazer o seguinte exercício:
- Foque a sua atenção no modo como respira. Se conhecer o modo como respira habitualmente, poderá usar a respiração para se relaxar em momentos que se sinta ansioso.
- Concentre-se nas partes do seu corpo (tórax) que usa para respirar. Sinta como os diferentes músculos se movem durante a inspiração e a expiração, sinta isso.
- Esteja tento a todas as sensações que sente quando respira. Memorize essas sensações, para poder reproduzi-las em situação em que se sente ansioso.
- Agora, coloque uma mão em cima do peito e outra sobre o seu estômago.
- Note os movimentos de expansão e de contração do peito, à medida que inspira e expira.
- Note os movimentos de expansão e de contração do estômago, à medida que inspira e expira. Foque-se nessas sensações durante 1 minuto.
- Em seguida sempre que verificar que está a respirar pelo tórax, mude para os músculos do estômago.
- Em seguida foque-se na expiração, liberte o ar por entre os lábios, para controlar a sua saída…verifique se são os músculos do abdômen e do diafragma que se contraem.
- Repita o processo demorando o dobro do tempo para expirar do que a inspirar o ar.
O exercício de focar-se na respiração
retira a criança da construção de um cenário catastrófico, dando-lhe a
possibilidade de posteriormente focar-se no que pode fazer para
solucionar ou minimizar o problema que o perturba. Passando de um
discurso de: “E se a Inês não falar comigo hoje?” para “O que posso fazer para me certificar que a Inês fala comigo hoje?“
7. Não evite tudo que causa ansiedade à criança
A criança quer evitar
eventos sociais, os cães, a escola, aviões ou basicamente qualquer
situação que causa ansiedade? Como pai, você quer ajudá-la a não sofrer
com a ansiedade? Claro! Isso é natural. A resposta de fuga ao que nos
provoca incômodo é natural. Infelizmente, a longo prazo, evitar a
ansiedade aumenta-a. Então, qual é a alternativa? Tente a exposição
progressiva e gradual às coisas temidas.
Vamos
dizer que o seu filho tem medo de sentar-se nos baloiços no parque. Em
vez de evitar essa atividade, deve criar mini-metas para chegar mais
perto do objetivo maior. Por exemplo, vá até a limite do parque, em
seguida, entre no parque, depois aproxime-se da zona dos baloiços, em
seguida sente simplesmente a criança no baloiço, comece com pequenas
oscilações e finalmente deixe baloiçar-se sozinha. Toda esta progressão
poderá levar alguns dias, fazendo um ou dois avanços por dia. Você pode
usar cada etapa até que a exposição se torna muito fácil e deixe de
causar desconforto à criança, esse é o momento em que você sabe que é
hora de passar para o próximo degrau na escada da exposição.
Você é o suporte da criança
Dar
suporte a uma criança que sofre de ansiedade pode ser doloroso,
frustrante e confuso. Não há um pai que não se pergunte em um momento ou
outro, se eles são a causa da ansiedade de seus filhos. É importante
que você saiba que a pesquisa mostra que a ansiedade é muitas vezes o
resultado de múltiplos fatores (ou seja, genes, fisiologia do cérebro,
temperamento, fatores ambientais, eventos traumáticos do passado, etc.).
Por favor, mantenha em mente, que provavelmente você pode não ser a
causa da ansiedade da criança, mas você pode ajudá-la a superá-la.
Se
verificar que apesar dos seus esforços a criança continua a sofrer de
ansiedade, e esta continua a aumentar, procure ajuda profissional. Fonte: escolapsicologia.com
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